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Ramires: "Todos os dias vamos matar um leão até final da época"
Ramires sofreu uma lesão muscular em Liverpool, frente ao Everton. Para o Guimarães está fora de hipótese. O médio acelera para poder alinhar no seu primeiro dérbi.
Como está fisicamente?
Ainda tenho dores, mas estou a melhorar. Estou a fazer tudo de forma correcta para poder jogar com o Sporting. Tanto eu como o departamento médico estamos a correr para ver se fico bem até lá.
Vai ser o seu primeiro clássico no futebol português...
Sim. Joguei vários no Brasil e são diferentes de todos os outros desafios. Em todos os jogos dá-me um friozinho na barriga. Mas nos clássicos ainda fico mais nervoso.
Mas ainda lhe dá frio no estômago em todos os jogos?
É verdade. Mas acho que é uma coisa boa, pois é sinal que há muito querer. Depois quando a bola começa a rolar, fico mais tranquilo.
Já se fala no dérbi no balneário?
Não. Primeiro temos de ganhar ao Guimarães. Não podemos já estar a pensar no Sporting.
Mas era natural que comentassem o facto de o Sporting estar a viver momentos conturbados...
Mas não vejo ninguém falar sobre isso. De qualquer forma, a crise no Sporting não nos facilita a vida. Pelo contrário. O jogo vai ser muito mais difícil, pois eles vão querer provar que estão bem. Quanto a nós, todos os dias vamos ter de matar um leão até final da época [risos].
Qual é o segredo deste Benfica?
É a união, a concentração, a maturidade e toda a gente se respeitar, isso é muito importante. Para além do trabalho claro.
O balneário está motivado...
Sim e não é só pelo facto de estarmos a fazer goleadas. O facto de estarmos a jogar bem e termos o apoio do treinador faz com que o nosso moral esteja muito alto.
"Segurança do Braga fez-me uma gravata"
Pela primeira vez, Ramires conta que foi agredido no túnel de acesso aos balneários do Estádio Axa, a 31 de Outubro, no fim da partida entre o Sporting de Braga e o Benfica. Os encarnados queixaram-se, após o jogo, que tanto ele com Cardozo tinham sido agredidos por um segurança. Em entrevista ontem a O JOGO, Ramires fala sobre este incidente e, no pólo oposto, do quanto está feliz na Luz. Diz mesmo que está a atravessar o melhor momento da sua vida.
Foi mesmo agredido no túnel no jogo com o Braga?
Sim.
O que aconteceu?
Eu estava a separar os meus companheiros à entrada do túnel, virado de costas, e veio um segurança por trás e fez-me uma gravata. Eu tentava libertar-me mas ele sufocava-me cada vez mais. Até que me largou, empurrou-me e agrediu-me. Não entendi, pois eu estava a tentar separar os colegas.
E não sabe quem foi?
Ainda fui atrás dele para lhe perguntar porque tinha feito aquilo, mas ele fugiu. Sei que foi um segurança mas, no meio de tanta confusão, não gravei o rosto dele.
À parte esse episódio, como está a ser a experiência no Benfica?
Está a ser tudo bem bom. Aliás, estou a passar pelo melhor momento da minha vida, do ponto de vista profissional e pessoal. Vou ser pai dentro em breve, a equipa está muito bem, não podia pedir mais.
Chegou ao Benfica já com muitos jogos ao serviço do Cruzeiro e da selecção do Brasil. Não teve sequer férias. Como tem gerido esse cansaço?
Não tenho sentido muito cansaço devido ao ritmo elevado de jogo. Acho que sou diferente: quanto mais jogo, menos cansaço sinto. Eu quero é estar em campo. Só depois de ser campeão é que vou descansar.
Mas o corpo não é uma máquina. Nem uma pontinha de fadiga?
Sim, é normal. Mas não me tem prejudicado.
Tem sentido da parte do treinador algum cuidado em gerir a sua condição física?
Sim, ele tem essa preocupação, mas não me passa pela cabeça nesta altura ter férias. Só penso em ajudar a equipa a ser campeã nacional.
Mas se agora, de repente, tivesse férias para onde iria?
[risos] Agora sou casado e tudo o que decido tem de ser com a minha esposa. Mas acho que ficaria em Portugal e aproveitava para conhecer alguns lugares aqui. Só ainda fui a Belém, não conheço mais nada.
Ao menos comeu um pastel de Belém?
Não [risos], havia uma fila enorme na pastelaria...
A confusão
Eu tentava libertar-me mas ele [segurança] sufocava-me cada vez mais. Até me largou, empurrou-me e agrediu-me. Não entendi, pois estava a tentar separar os meus colegas.
O máximo
O meu filho, que se vai chamar Davi, nasce em Abril. Imaginem: o meu filho nascer, ser campeão pelo Benfica e, depois, ir ao Mundial... Seria fantástico tudo acontecer ao mesmo tempo!
O dérbi
A crise no Sporting não nos vai facilitar a vida. Pelo contrário. O jogo vai ser muito mais difícil, pois eles vão querer provar que estão bem
Naturalizações
Não sou nada contra. Acho que vai da vontade de cada jogador. Se eu não tivesse tido oportunidade na selecção brasileira e houvesse intenção de outro país contar comigo, porque não?
"Estava nervoso e sempre a mexer nas mãos"
Simples e directo. Ramires não esconde que sofreu muito no jogo entre o Benfica e a Naval, na última jornada. O médio brasileiro seguiu o jogo da bancada e confessa que estava muito nervoso. Recorde-se que o Benfica chegou ao triunfo apenas nos derradeiros instantes do encontro...
"Puxa... se sofri! A partir do momento em que assinei pelo Benfica, comecei logo a sofrer pelo clube. Somos uma equipa e se um perde, todos perdem. Ainda agora, frente à Naval, fiquei a torcer pelos meus companheiros. Fico bastante nervoso e ansioso, a mexer as mãos, não consigo ficar parado. A minha mulher diz para eu parar, mas não há maneira de o fazer...", comentou Ramires.
"Jorge Jesus ensina a passar e cruzar"
Ramires está na Luz como peixe na água. Plenamente adaptado à realidade da cidade e do País, o médio adianta, todavia, que Jorge Jesus ainda lhe vai fazendo algumas correcções diariamente. "Ele diz-me como melhorar nos cruzamentos e no passe. É que aqui o passe é mais forte e em cima do companheiro. No Brasil, não se passa assim. Mesmo o relvado não permite um passe tão em cima do colega. Aos poucos, estou a melhorar", sublinha, não poupando nos elogios ao técnico encarnado: "O mister é excelente como pessoa e treinador. Não é preciso falar muito sobre isso, basta ver o que ele está a fazer no Benfica. E no balneário trata toda a gente de igual forma, sem diferenças."
A relação é boa a tal ponto que o camisola 8 "nem hesitaria" em apoiar-se no treinador para "resolver um problema pessoal". "Quem sabe se não poderia ajudar?", atira.
"Se precisarem jogo a ponta-de-lança"
Sempre jogou como médio-interior direito?
Joguei como defesa-central quando era miúdo, no Joinville, depois passei a médio-defensivo e, quando me tornei profissional, comecei a jogar mais encostado à direita. Mas gosto de experimentar posições novas.
Até a ponta-de-lança?
[Risos] Se precisarem, quem sabe?
Quem eram as suas referências no futebol quando era miúdo?
Patrick Vieira e Beto, do Flamengo.
Ainda torce pelo Flamengo?
Já não. Agora, torço pelo Cruzeiro, pelo que fiz lá e pelo carinho que a sua torcida sempre manifestou por mim. Lembro-me que num jogo com o Palmeiras levaram-me ao colo e abraçaram-me. É contangiante...
Já é assim no Benfica?
Sim! Já nem consigo passar despercebido na rua. É bom, porque é o reconhecimento do meu trabalho.
"Se parasse hoje, amanhã estava falido"
Ramires conta que passou fome na infância e que, apesar de hoje ganhar bem, ainda não conseguiu fazer um pé de meia.
Passou dificuldades na infância?
Fui educado pela minha avó e, quando ela morreu, tudo ficou mais difícil. A minha mãe morava noutra cidade e mandava dinheiro quando podia. Mas eu e os meus irmãos passámos dificuldades.
Mas que tipo de dificuldades?
Às vezes só jantava e não almoçava. Ou o contrário. Muitas vezes, ia ao salão de cabeleireiro onde trabalhava a minha tia Janete e ela dava-me dinheiro para comprar umas salsichas e milho para fazer pipocas, para não passar fome. E a roupa, usava sempre a que tinha sido do meu irmão.
Já foi muito pobre. Agora recebe um bom ordenado. Não acha exagerados os salários dos futebolistas?
É um trabalho como outro qualquer, em que existe um patrão e temos de nos comportar bem perante ele. Muita gente critica, mas a gente abre mão da família, da privacidade e de muitas outras coisas para se dedicar ao futebol. Comparando com o que ganhava, sinto-me feliz e procuro ajudar a minha família. Quanto mais se ganha, mais se gasta e no fim é quase o mesmo (risos).
Se deixasse agora de jogar, já tinha uma boa poupança?
Xi... Se parasse de jogar hoje, amanhã estava falido (risos) e cheio de dívidas. Ainda não juntei nada.
Qual o maior luxo que já fez até agora?
Foi o meu primeiro carro, ainda no Brasil, um Fiat Stilo. Ainda hoje estou a pagar a sua prestação.
Um Fiat Stilo foi o seu maior luxo?
Puxa! Na altura, se foi...
Magreza é natural e sai ao pai
A sabedoria popular não perdoa e, quando perante indivíduos que parecem ser imunes à ingestão de alimentos, depressa se ouve: "Se come e não engorda, é da ruindade". Ramires já ouviu a frase muitas vezes, mas explica que até já está a trabalhar para se tornar mais forte. "No Brasil, também dizem isso [risos]. Mas saio ao meu pai, que era muito magrinho. Como bastante e não engordo! Aqui, já estou a fazer musculação e vai começar-se a notar a diferença", adianta.
Amorim e David Luiz são uma dupla brava
Ramires agradece a rápida adaptação ao clube a Luisão. Companheiros também na selecção, o subcapitão foi decisivo para o bom entrosamento do médio com os novos colegas. "Antes de vir para cá, estive com o Luisão na selecção e ele falou-me maravilhas do clube. Foi impressionante a maneira como fui recebido", sublinhou, destacando a boa disposição de Rúben Amorim e David Luiz, considerando-os mesmo os mais brincalhões do balneário: "O Rúben Amorim e o David Luiz são uma dupla brava...", Colega de quarto do guardião Júlio César, não quis, no entanto, revelar alguns dos segredos do balneário.
Pagode deu casamento
Sempre bem disposto, Ramires não coloca reservas a mostrar um pouco mais da sua vida pessoal. E não deixa de ser curioso o facto de ter conhecido a sua actual esposa, Islana, numa típica festa canarinha. "Estava ainda no Joinville e foi numa ida a um pagode. Depois começámos a falar, a ir ao shopping juntos e, pronto, o normal [risos]. Casámos há dois anos e é o meu grande suporte". Islana está, aliás, grávida e o médio só espera juntar mais alegrias à festa: "O meu filho, que se vai chamar Davi, nasce em Abril. Imagina: o meu filho nascer, ser campeão pelo Benfica e depois ir ao Mundial... Seria fantástico tudo acontecer ao mesmo tempo!".
A favor das naturalizações
Sem complexos, Ramires assume que tomaria a mesma decisão de Deco, Pepe e Liedson se não tivesse oportunidade de jogador pelo seu país de origem: "Não sou nada contra. Acho que vai da vontade de cada jogador. Se eu não tivesse tido oportunidade na selecção do Brasil e houvesse intenção de outro país em contar comigo, porque não?", explicou, voltando a falar do sonho que será estar na África do Sul. "Há uns quatro, cinco anos só imaginava poder ir ao Mundial. Hoje tenho esse gostinho de saber que só depende de mim e do que fizer em campo pelo Benfica."