janeiro 17, 2012

Por força da lei _ Ricardo Costa


No apito do Governo (II)
 
Comparar a arbitragem de 1.ª categoria do futebol de hoje com a arbitragem que tínhamos em 2006 é um exercício apenas destinado à comprovação de que as distâncias não são só entre a escuridão da noite e a luz do dia. As diferenças são colossais (como agora se diz) e notam-se (mesmo que não diminua o atrupido dos “especialistas” em repetições).

Para isso foram decisivos dois fatores. Primeiro, os processos desportivos do Apito Dourado, nomeadamente na Federação mas também os da Liga: porque colocaram a nu a promiscuidade entre dirigentes e árbitros, o tráfico de influências e a corrupção; porque castigaram e afastaram árbitros e outros agentes da corporação e levaram outros (e com eles também dirigentes) a autoafastarem-se da “delinquência”; porque fragilizaram os “esquemas” (a maior parte deles sem condenação à luz dos regulamentos então aplicáveis) e a sua chocante “habitualidade”, os “esquemas” que a prova nesses processos exibiu abundantemente. O segundo fator foi a assunção de funções na Comissão de Arbitragem da Liga da equipa constituída por Vítor Pereira, Antonino Silva e Domingos Gomes, que têm na cabeça a única reforma estratégica que a arbitragem portuguesa teve até aos dias atuais. Quando se puder fazer com serenidade e distanciamento histórico o relevo da Liga existente entre 2006 a 2010, longe da espuma dos interesses dos que, por ora, ainda ditam (ou pensam ditar) “leis” e “ordens”, nela figurará em primeiro plano o gérmen de um projeto para toda a arbitragem do futebol.

O terceiro fator que mudará em definitivo o quadro de ação dos árbitros vem também dessa Liga: o empreendimento de profissionalização dos árbitros das competições profissionais. Insuscetível de avançar por si só na regulamentação desportiva do foro associativo, o Governo nomeou um outro grupo para estudar o tema. Tem em mãos uma proposta favorável ao enquadramento jurídico da sua atividade profissional e exclusiva (a começar, em primeira linha, pela elite dos “internacionais”), vendo os árbitros como agentes desportivos de alto rendimento – muito longe, pois, do árbitro como um agente desportivo suspeito e permeável. Em contraponto, temos o árbitro como agente que progride e permanece na carreira em razão da qualidade do desempenho; como objeto de uma avaliação que atende com rigor e transparência aos seus graus de competência; como quadro de formação superior inserido numa organização que privilegia as capacidades académicas; como técnico especializado com um específico “sistema de valorização, formação e treino”, em igualdade de circunstâncias com jogadores, treinadores e dirigentes. Conclusões: “o desporto-espectáculo converteu-se num fenómeno demasiado sério para poder continuar a ser arbitrado por quem não seja um profissional do desporto”; o árbitro profissional errará menos vezes; a indústria será mais credível.

C abe agora ao Estado aproveitar o ensejo e fechar a tríade gerada nas escutas da PJ: dar um estatuto jurídico ao árbitro e à sua via profissionalizante; dar-lhe um corpo legal e, simultaneamente, uma defesa. Falta agora definir como…


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