Artur Jorge na Luz
Diz-se que acontece em todas as áreas da vida. A alegria e a tristeza, o amor e o ódio, tantos sentimentos opostos, tantas sensações antagónicas. Caminham de mão dada? Caminham, no mínimo, lado a lado. Em todas as áreas da vida, no futebol também. Muito no futebol, espaço quase singular de arrebates, de sobressaltos, de alvoroços.
No futebol, queira-se ou não, a justiça é o reflexo dos golos, dos triunfos, dos títulos. No futebol, queira-se ou não, sem golos, sem triunfos, sem títulos não há justiça. Há frustração, há desânimo, há animosidade. Mas também há momentos surpreendentes.
Recentemente, por ocasião do lançamento da minha nova biografia de Eusébio e do seu 70º aniversário, convidei Artur Jorge a comparecer na cerimónia. Entrei com ele na Luz, na nova Luz, espaço que jamais havia visitado. Grande jogador do Benfica, na dobragem das décadas de 60 e 70, Artur Jorge chegou a fazer as delícias dos adeptos vermelhos, tão manifesta era a sua apetência goleadora. Mais tarde, já como técnico, notabilizou-se no FC Porto, arrebatando mesmo um título europeu, circunstância que lhe conferiu dimensão mundial e muito contribuiu (foi uma espécie de precursor de José Mourinho) para aumentar a cotação dos técnicos portugueses no contexto internacional.
De regresso ao Benfica, Artur Jorge não foi feliz. A conjuntura era, desde logo, particularmente adversa. Foi altercado com veemência, foi mesmo diabolizado. O estigma, tantas vezes repetido, de ter aniquilado uma equipa campeã ainda hoje o persegue. Artur Jorge e Benfica passaram, na versão futebolística, a viver um divórcio com foros de litígio irreparável.
Há dias, entrei com ele na Luz. Dezenas de sócios e aficionados benfiquistas foram colhidos de surpresa. Como reagiram? Com elegância, com cordialidade, com respeito. Ou mais uma lição que a bola soube dar num momento em que o país vive uma fase de brutal desumanidade e crispação atroz.
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