A nova SAD (IV)
Em cima da mesa do Estado-legislador está um novo regime das sociedades comerciais dedicadas à atividade desportiva. Desde 1997 que subsiste uma disciplina para as sociedades anónimas desportivas (SAD), que mudaram o ambiente de exigência nas modalidades com provas profissionais, em especial o futebol. SAD não foi sempre sinónimo de vigor económico e salubridade financeira, nem evitou os erros de gestão que conduziram às falências conhecidas ou iminentes. Mas a SAD trouxe rigor, transparência e instrumentos para atrair gestores qualificados. E (por contágio) melhorou as práticas de gestão dos clubes (não sociedades) que preservaram o figurino tradicional. Tenho ensinado (com algumas críticas à lei), redigido e dito isto na última década. Tenho lido escritos e avaliado na universidade trabalhos académicos que enfatizam esse dado. Em suma, quer queiramos quer não, há (em especial) um futebol antes das SAD e outro futebol depois das SAD.
A proposta do “grupo de trabalho” nomeado pelo Governo traduz a ultimação do projeto inicial: nas competições profissionais devem exclusivamente participar sociedades comerciais desportivas; as competições não profissionais são o espaço natural de ação dos clubes. Sugere-se que acabe o “regime especial de gestão” que onera e responsabiliza atualmente as “secções profissionais” e os dirigentes dos clubes associativos que optam por assim participar nas provas de caráter “não amador”. A ideia é substituir nas competições profissionais o clube por uma sociedade por quotas com um único sócio, em que este é precisamente o “clube”. É um caminho que vai ao encontro do que sempre defendi: a sociedade por quotas como sociedade adequada às pequenas e médias empresas é, unipessoal ou com uma pluralidade de sócios (hipótese esta que a lei não deveria negar), a estrutura mais aconselhável para a maioria dos clubes nacionais. Ademais, para alguém, como eu, que dedicou vários anos, na investigação académica e na experiência prática, às “sociedades unipessoais” e às “sociedades desportivas”, esta proposta não deixa de ser uma feliz conjugação.
Para além dessa possibilidade de uma “sociedade unipessoal desportiva”, mantém-se a velha SAD. Porém, na modalidade mais importante de “personalização de equipa” diminui-se o mínimo de percentagem das ações detidas diretamente pelo clube, que passaria a ser de 10%, e deixa de estabelecer-se um teto máximo para essa participação direta, que é atualmente de 40%. Continua, mesmo assim, a permitir-se que os clubes recorram a sociedades “holding” para aumentar “indiretamente” essa percentagem mínima. Ou seja, uma SAD mais ou menos controlada pelo clube de acordo com a vontade de a “abrir” em maior ou menor medida ao capital alheio. Só se peca por se continuar a prever necessariamente certos “direitos especiais” para o clube, mesmo que o clube tenha, direta e indiretamente, a maioria do capital.
Nada, aliás, que ainda não possa ser melhorado. Ainda que o tempo urja – o “grupo de trabalho” recomenda que a nova lei comece a sua vida em julho. Aguarde-se, pois, pelo resultado da urgência.
In Record
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