Tons de verde
Vale a pena partir de um princípio básico: nem os sportinguistas precisam de lições de moral nem os responsáveis por outros clubes portugueses, em especial os chamados “grandes”, estão em condições de lhas dar. Ou seja, qualquer atitude sobranceira face às ocorrências de uma campanha e de uma noite eleitorais – o dia foi absolutamente exemplar e sintomático do desejo dos sócios fazerem ouvir as suas vozes, depois de um consulado desastroso para o clube – pode ser repelida com um simples espelho: selvagens infiltrados há em toda a parte e, assim, a única surpresa (e só para alguns) está na morte definitiva do Sporting enquanto clube da diferença e das elites. Nada disso: tem os mesmos problemas dos outros, agravados pelo estado das finanças e pelos resultados desportivos.
Este pressuposto inicial também não pode impedir a análise e o comentário a um processo eleitoral que, mais do que propostas, acabou por deixar feridas – tal foi o nível a que se desceu, com suspeições pessoais e ataques que ficaram por comprovar. Houve quem visse nas cinco candidaturas uma manifestação de vitalidade democrática. Não creio: Dias Ferreira, que tanto se esforçou para apresentar uma identidade de veterano outsider, é da mesma “família política” (e só falo do Sporting, como é óbvio) de Godinho Lopes. E lançar em simultâneo dois projetos de corte estrutural – os de Bruno de Carvalho e Pedro Baltazar – significou perder terreno para o establishment. Claro que foi em cada subgrupo que o tom entornou: Dias Ferreira não perdeu oportunidade de “marcar” Godinho Lopes, tal como Baltazar fez de Carvalho o seu inimigo principal. Com poucas vantagens, a não ser a demarcação de território para memória futura.
Na noite eleitoral, aquilo que aconteceu foi um triste epílogo da campanha, aliado a um processo de contagem de votos que, de tão obsoleto e demorado, foi ajudando a alimentar a especulação e ainda agora contribui para alimentar a dúvida. Houve contrainformação à solta? Claro que houve. Mas culpar a comunicação social e uma sondagem não desculpa a corrida à “cacha” (sensível sobretudo em canais de TV) nem anula a existência de múltiplos responsáveis, de Rogério Alves (e o “rumor” que ele acabou por corroborar) a João Lino de Castro (presidente em exercício da assembleia geral), que decidiu tornar-se protagonista às seis da manhã e tantas explicações deixou que acabou por baralhar ainda mais.
Acredito que a impugnação ficará pelo caminho. Mas se a missão de Godinho Lopes já era espinhosa, acaba por tornar-se ainda mais difícil, com um Sporting partido (até por uma perigosa fronteira etária) e que não vai dar-lhe tréguas, quanto mais estado de graça. O tom de verde continua escuro.
In Record
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