O golpe de estádio |
1. O Ministério Público de Lisboa notificou a Direção da FPF no sentido de serem alterados os Estatutos da FPF num prazo de 30 dias. O MP, ao verificar que 16 cláusulas desses Estatutos estão em desconformidade com o Regime Jurídico das Federações (RJFD) e que já deveriam ter “desaparecido” ou sido modificadas até 30/6/2010, entendeu que essas cláusulas são nulas – em face da violação dessa obrigação legal de conformação dos Estatutos. Se isso não acontecer, o MP avançará para tribunal. A Direção entregou a solução aos “serviços jurídicos”. Avançou a imprensa que a Direção pretende aprovar ela própria a alteração dos estatutos e, com isso, responder ao “ultimato” do MP; haveria um entendimento na FPF de que a sanação das nulidades detetadas pelo MP não corresponde a uma “alteração dos estatutos”; até já haveria notário disponível para celebrar a escritura pública.
2. Se isto é assim, o caso é surpreendente.
(a) Em nenhuma circunstância a Direção da FPF se pode substituir à Assembleia Geral (AG) no exercício da competência exclusiva de modificação dos estatutos. Esta competência resulta imperativamente do art. 172.º, 2, do Código Civil e consagra-se nos Estatutos da FPF.
(b) O que está em causa é modificar ou suprimir cláusulas existentes e, em complemento, introduzir cláusulas novas – tudo isto são espécies de modificação dos estatutos de uma pessoa coletiva. O facto de essas alterações serem impostas pela lei – nomeadamente para se manter a utilidade pública conferida pelo Estado – em nada muda o seu caráter.
(c) Se a Direção da FPF deliberar a modificação dos Estatutos, essa deliberação será nula por ofensa de regra imperativa de competência e impotente para gerar quaisquer efeitos jurídicos. Ou seja, continuaria por cumprir o dever de transpor o RJFD e o MP não veria sanadas as nulidades comunicadas à FPF. Como é óbvio, nulidade não se sana com fraude à lei nem com outro ato nulo.
(d) Os notários estão obrigados por lei a recusar a prática de qualquer ato nulo.
(e) Abstraindo do facto de o mandato federativo ter terminado em Janeiro de 2011 (“outro” problema), poderia defender-se, em condições normais, que a aprovação pela Direção de alterações estatutárias constituiria fundamento para a destituição em AG do Presidente e dos membros da Direção FPF, por grave violação do dever de zelar pelo cumprimento dos Estatutos.
3. Então, o que fazer? A Direção, quando notificada pelo MP, não ficou obrigada a aprovar ela própria estatutos novos e a evitar a ação judicial do MP. Fica obrigada a fazer aquilo que lhe compete estatutariamente e é instrumental para essa alteração. Logo, elaborar a proposta de alteração dos Estatutos e solicitar ao Presidente da Mesa da AG a convocação de uma AG estatutária, com menção na convocatória das cláusulas cuja alteração é exigida pelo MP. Notifica o MP das diligências que fez dentro do prazo fixado e para as quais tem poderes. Cabe ao MP aguardar pela decisão da AG e fazer respeitar a lei.
4.Como, em jeito de alerta, digo aos meus alunos há anos a fio: no Direito há posições para tudo; mas há limites…!
In Record
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