setembro 20, 2011

Por força da lei _ Ricardo Costa



Negócio com bola

Há uns meses atrás fiz uma conferência sobre a administração das sociedades anónimas desportivas (SAD). A propósito dos resultados deficitários da sua atividade, referi os traços gerais das formas que a lei proporciona para que aqueles que gerem as SAD indemnizem a sociedade e os credores lesados pelos prejuízos causados pela ação – ou inação – desses administradores. E levantei a questão para o futebol: alguma vez haverá ações judiciais a pedir a responsabilidade dos gestores das SAD por “má gestão” ou “gestão ruinosa”? Não tenho conhecimento que haja. É natural que não haja mesmo, pelo menos por decisão da própria SAD em assembleia geral: o clube é o sócio maioritário ou “controlador” da SAD; os administradores das SAD são muitas vezes (no todo ou na sua maioria) as mesmas pessoas que são Presidente e Diretores do clube; é a assembleia geral que delibera a proposição dessas ações; as assembleias gerais são tudo menos populosas...

Nessa altura tive oportunidade de alertar para uma norma da lei das SAD de 1997: exige-se que os seus administradores sejam “gestores profissionalizados”. Manifestamente a lei quer que as SAD sejam administradas por sujeitos detentores de uma habilitação particular para os negócios desportivos de uma certa modalidade, estreitando-se no “clube SAD” a base larga com que tradicionalmente se recruta aqueles que dirigem os “clubes associativos”. Uma habilitação feita de conhecimento da atividade, competência técnica, disponibilidade e experiência no ramo, suscetível de constituir uma garantia de fiabilidade para o “mercado”. Tal significa que as sociedades anónimas dedicadas à participação em competições desportivas e à organização dos espetáculos desportivos exigem um “tipo legal” de administrador particularmente qualificado, com menor probabilidade, logo, de fazer com que “o negócio corra mal”.

A primeira fase de vida das SAD não respeitou, em geral, a solicitação da lei: a comunicação com os clubes fundadores foi perniciosa e não permitiu um salto qualitativo nos quadros. A segunda fase, porém, tem permitido o acesso ao “conselho de administração” de um outro tipo de gestores, inclusivamente aportando ao negócio desportivo “know-how” de outros ramos – tem sido assim, nomeadamente, nas matérias financeiras, na formação desportiva e nos assuntos do “marketing” e da publicidade global. Contudo, as decisões estratégicas, a política global, a “última palavra” nos assuntos vitais continuam a estar nas mãos de uma certa irracionalidade, de uma ligação excessiva com a álea do resultado e até de um comprometimento com interesses que não coincidem com o interesse da SAD. Só assim se podem explicar a contratação de tantos técnicos e tantos jogadores sem proveito, a gerência ilógica dos benefícios associados aos direitos televisivos e as relações com certos agentes.

O certo é que, no fim, conta a bola na rede e o facciosismo. Não contam “as contas” e “os saldos”. A razão conta pouco. Mas, como melhor se verá nos próximos tempos, não tenham dúvidas que nestes anos de SAD muitas ações deveriam ter entrado em tribunal...

 In Record

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