setembro 22, 2011

Tempo Útil _ João Gobern


Dos zeros ao pleno

O imprevisto empate do FC Porto frente ao Feirense, ainda mais surpreendente porque os campeões vinham dando excelentes sinais de assimilação das particularidades de Vítor Pereira, pode ter aberto portas a um clássico que ajude a resgatar de vez a ideia de que o futebol em Portugal não precisa de ser sempre uma fórmula ou uma batalha, também pode afirmar-se como espetáculo.

Se a vantagem pontual dos nortenhos ainda se mantivesse, poderia o Benfica reclamar que a exibição necessitava de subordinação ao resultado, uma vez que era fundamental não deixar estender a vantagem do líder. Assim, uma derrota no embate do Dragão não ganha a chancela de irreversível, não justifica ainda o carimbo de irremediável. O que é um bom motivo para que ambas as equipas, precisamente aquelas – com o devido respeito pelo Braga, em mudança, e sobretudo pelo Sporting, em reconstrução – que melhor futebol praticam, possam finalmente pôr em campo os trunfos de que dispõem, de uma forma que não se fique pela vergonha, pelo taticismo, pela obsessão de manietar os ases do adversário, pelo calculismo dos pontos ou dos troféus. É, porventura, uma ocasião única para deixar saltar os artistas, para dar poder aos operários, para que a criatividade e o sacrifício, o talento e o suor nos reconciliem de vez com o que resta de pureza e beleza no futebol, tão cheio de podridão, de mascaradas, de “habilidades” e chico-espertos.

Adivinho que haja muitos que, aqui chegados, já se cansaram do romantismo e da utopia que há neste desejo, pouco condizente com a época, com os orçamentos, com as mentalidades. Lamento, mas não chega para me fazer mudar de ideias – eu sou daqueles que sonham com a possibilidade de, quando os hunos se calarem e os domínios passarem de mão, voltar a ver FC Porto e Benfica a disputar jogos amigáveis e a manterem relações cordiais, ao ponto de cada encontro entre as duas equipas ser (de momento, tendo em conta as dificuldades do Sporting) o expoente que se pode oferecer ao consumidor nacional, em vez de ser gerador de tensões irracionais, de comportamentos bélicos, de flashes de vergonha para quem tem que explicar a um filho o que o apaixona e o arrebata no futebol.

Um primeiro passo cumprir-se-á se dirigentes e jogadores (mas estes, reconheçam-se, raramente são culpados) mantiverem o silêncio ou o bom senso. Se o árbitro não for imediato motivo de desconfiança. Se os técnicos evitarem a arrogância e o baixo nível. Depois, só falta que na sexta-feira Hulk e Gaitán, Defour e Witsel, João Moutinho e Aimar, Kléber e Saviola, Rolando e Luisão, Helton e Artur façam mais do melhor que sabem e podem. Se o futebol ganhar, num jogo destes, quase apetece dizer que não há quem perca.


In Record

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